sexta-feira, 1 de julho de 2011

LIMITES ANTIGOS - POBRE DE MIM!...



Estive lá. Não foi proposital, porém foi fatal. Um precioso golpe que abriu uma lesão sem cura. Ao me deparar com os primeiros casarões veio-me à mente as palavras sagradas “Não removas os marcos estabelecidos pelos antigos”. Tinha à minha frente ruas sinuosas, calçadas com pedras toscas. Eu sabia, em cada casa, uma história, em cada pedra, mãos escravas sangravam. Era impossível não ser poeta naquele lugar, pois que ali, a poesia parecia adormecida em um canto, no outro, corria, esgueirava-se pelas calçadas seculares, zombava da minha dor fugindo para os becos, depois, logo depois, vinha sorrindo, flertando, escravizando-me em seus encantos. Isso era fatal! Como resistir a ela? Como não me apaixonar por sua lesão? Que pena de mim que não descobri aquela terra antes!...
Vila Boa de Goiás. Outra viagem a trabalho, discussões, estatutos, promessas... A vida de todos é assim. Entrei naquela cidade porque já amava Cora, mas não podia imaginar ruas como aquelas. Somos assim, e, às vezes, é necessário escutar a própria alma porque é ela que nos aponta uma direção menos necessária, porém, mais humana e feliz, por isso, divina. Sou pastor e sei o quanto sofremos por eliminarmos o humano e o feliz do divino.
Fui à casa de Cora – A casa da ponte. Pobre de mim! De repente, me vi apaixonado pela ausência de uma velha, bebendo resquícios de sua presença. Como desejei ter estado ali antes... Teríamos muito que falar (eu teria muito que ouvir). Vi o fogão de lenha onde fazia seus doces, a cadeira onde se sentava para escrever, o ladrilho do chão, tão goiano na sua simplicidade. Fui tomado por uma saudade cortante do que não tive. Fui ao porão, beberiquei água da bica lá de baixo... Quanta tolice, pois que eu sentia ausência do que não foi meu. Pensava uma coisa só: como pude viver tão perto, por tantos anos, e nunca ter vindo até ali? Ocupação e cegueira. A ocupação escraviza e a cegueira mediocraliza. Pobre de mim! Deixei Vila Boa grato por tudo o que vi e sonhando com o que não vivi. Em casa, quase dois mil quilômetros depois, apanhei o livro de Cora e compreendi a ponte que faz aquela casa com o que diz o escritor sagrado.
Simples e dorido. Tudo o que é belo está pleno de Deus. “Não removas os limites antigos”. Se Goiás Velho preservou a velhice de uma mulher e isso foi tão importante, penso no divisor de águas que será para muitos descobrir os marcos que o próprio Deus eterno estabeleceu. Em Vila Boa não se pode remover as fachadas dos casarões e nem asfaltar as ruas... São marcos dos ilustres e escravos do passado (e quanta beleza tem lá!). Nas escrituras há palavras tão ou mais fatais que as de Cora (é possível isso? É sim!...). As de Cora vão da ponte ao coração e encantam... As de Deus vão do encanto à mudança, e aí reside sua força, posso até dizer que as de Cora são respingos das de lá. Só para citar, os marcos eternos precisam ser caçados, achados e amados. Esperança é um limite antigo, crença é outro e o amor é o maior deles. Ao colocar os pés na casa da ponte e cruzar o Rio Vermelho, vi a importância dos marcos para aquela cidade – Ela vive disso. Que figura para mim, pobre de mim, para aquela sentença da sagrada escritura.

Paz e a gente se fala pelos encontros com as coisas antigas...

Eliel Eugênio de Morais
Pastor
Colorado do Oeste, 01 de Julho de 2011.