quinta-feira, 24 de junho de 2010

SOBRE UM LUGAR BELO E TRISTE...


Sou pastor e isso é irrefutável e doloroso. Irrefutável porque fui persuadido pelo Espírito Santo, e, doloroso, porque este é o ofício de lidar com o lado misterioso de Deus e da alma humana. Vim a um lugar de extrema beleza. É belo pela exuberância de sua natureza, porém, temo estar aqui. Temo por causa da violência dos corações, visto que ela mora em mais de uma pessoa. E também um pouco de tristeza, confidencial, dessas íntimas e meio saborosas, e a atribuo às estrelas deste lugar.
Ontem à noite eu vi a beleza, ela bailava em multidões de estrelas que espalhavam sua luminosidade pelo campo, e tinha aquela brisa amena do fim de outono, misturando-se aos meus bons pensamentos. Ouvi os sons de uma festa, pessoas que musicavam e falavam, e por elas a tristeza começou a confidenciar. Lembro a voz de um locutor que berrava a plenos pulmões que aquilo era uma festa para Jesus. E veio uma chuva das super qualidades e dos super poderes de Deus. Ele era, de repente, o mais veloz, o mais estrondoso, o mais curador de toda mais doença, sem dúvida o mais do fogo, da água, dos ventos, das super bênçãos... A lista não tinha fim, e eu fiquei pensando em como tudo aquilo estava distante do mínimo que Deus mais quis. Estaria, porventura, com a razão os que acusam a religião de ser a escora dos que não tem razão? Ou estaria certa a minha íntima suspeita de que o cristianismo de muitos não passa de uma versão monoteísta dos mitos que explicavam o que a razão não podia? Não foi assim com o vento, com o fogo, os trovões, a morte e as paixões? Estaria certa a minha suspeita última acerca da tristeza de Deus em ser ovacionado daquela maneira como um super tudo para um super nada da intimidade da alma?
Então, explico, achando-me triste em meio a um belo lugar, mas que me inflige o medo. Deus é mesmo o Senhor de todas as coisas, porém, por nenhuma delas se deu ao homem. O que ele quer das pessoas é suas intimidades, o silencio de seus corações. Deus nunca quis ser o super tudo de ninguém, visto que isso nada transforma. Quis sim, uma relação íntima e profunda, sem os ruídos dos rituais ou as ovações dos pretensos adoradores, nunca foi seu propósito substuir na unicidade da idéia aquela multiplicidade de mitos, pois o que não deu respostas no passado, também não alimenta as almas de hoje, pois também, Deus continua misterioso e as paixões e fogaréus ainda são enigmas legítimos. O que antes pareceu loucura nos mitos, hoje, transliterado no monoteísmo, parece-me apenas ilusão e vazio.
Ah, e tem a questão da beleza e violência desta terra. Para a beleza tem a contemplação, e, para a violência, o cheiro. Refiro-me ao odor de que fala as escrituras, é o cheiro da alma e não o som dos festeiros dos que se identificam pelo nome de Cristo, que farão alguma diferença. É que a alma tem mais cheiro do que sons. Só uma coisa a mais, uma coisa para os locutores e para os festeiros: Deus quis muito mais ser conhecido pelos seus pensamentos e sentimentos, o que é intimidade, do que por seus poderes. Afinal, religião só é mesmo útil aquela que transforma a alma humana. Qualquer coisa menos que isso ou, além disso, é vazio.

Paz para você e a gente se fala pelas intimidades de Deus...
Eliel Eugênio de Morais
Pastor
Colorado do Oeste, 19 junho 2010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

SOBRE UMA DE TRÊS PESSOAS


A terceira pessoa

“Agradável” é o que significa seu nome: Naamã. Um dos grandes líderes militares de sua época. Conquistou o amor e o respeito do rei da Síria, porém, apesar de toda a sua força e poder, sofria de uma doença temível e terrível: a lepra.
Ouviu algo promissor de uma pequena e solitária escrava e, surpreendentemente, acreditou nela. E o rei preparou sua viagem. Os reis, tanto de Israel quanto da síria, foram secundários nessa história, até porque um assustou o outro com esse negócio de cura, que era assunto para o profeta e seu Deus, não para reis.
E o que aconteceu no fim da viagem? É necessário lembrar que Naamã queria uma coisa só, mas precisava de duas. Queria a cura da lepra que deformava suas carnes, mas precisava também da cura da alma, visto que essa deformava seu espírito no orgulho e solidão. Mas ele não reconhecia essa segunda doença, e o que ocorreu entre ele e o profeta na terra daquela menina, demonstra isso.
Naamã não teve um encontro com honrarias como era seu desejo, e recebeu instruções de um mensageiro em vez dos rituais que esperava. E o recado que recebeu também era menor do que sua expectativa. Foi lhe dito para ir ao Rio Jordão e lá mergulhar por sete vezes. Isso o irritou e humilhou e, por isso, recusou-se a obedecer. O que isso revela? Que apesar de ser grande em seu oficio, tinha uma alma diminuta, acostumada a batalhas, porem vazia de significado. Naamã precisava da cura que ele mesmo não reconhecia. Mas, pergunto eu, como julgá-lo? É simples reconhecer que não se tem a alma educável? É fácil reconhecer-se vazio quando nos acostumamos a grandes batalhas? É fácil julgar Naamã, mas o que ele fez é tão semelhante aos dias atuais... Ele demonstrou todo o seu orgulho e falsas expectativas de como seria tratado e de como o profeta lhe serviria a cura. Por isso foi inflexível. Queria soluções rápidas, dessas que tentam fugir ao preço da distancia a ser percorrida para uma cura, principalmente a da alma. Além disso, queria tratamento especial por causa das soluções íntimas que tinha sobre si mesmo. Foi assim que se irritou, sentindo-se injustiçado e, por isso, rejeitou a nova solução. Era mesmo um caso para a segunda cura que ele não via
Porém, Naamã era um líder e, como tal, tinha a seu lado pessoas que podiam se pronunciar. E esses lhe deram um conselho valioso. Isso mostra o quanto a alma é curável. Naamã mudou seu pensamento e foi limpo da lepra e livre de alma. A história mostra isso. Voltou até o profeta e ofereceu-lhe presentes e uma súplica. Pediu que lhe dessem terra de Israel para ser levada até o templo do deus das tempestades em Damasco, era o testemunho permanente de que seu coração adoraria somente o Deus único. E fica o legado desse grande líder, uma coisa bem didática: quem permanece educável recebe bênçãos contínuas e outras inesperadas, pois o orgulho e a teimosia são inimigos ocultos e macios, porém destroem a beleza da alma.

Paz e a gente se encontra pelos conceitos inesperados de Deus...
Eliel Eugênio de Morais
Pastor
Colorado do Oeste, 15 de junho de 2010.

SOBRE UMA DE TRÊS PESSOAS


A segunda pessoa

Uma menina sem nome. A própria formação do texto no livro dos Reis não a identifica. Diz somente que as tropas da Síria, sob o comando de seu mais ilustre general, vieram vitoriosos da batalha e trouxeram cativa uma menina da terra de Israel. Ela chegou, sem nome, sem parentela, sem companhia... E foi servir à mulher de Naamã.
E foi assim, servindo a uma pessoa estranha, numa terra estranha, uma cultura estranha e uma religião estranha... Seus captores adoravam um deus chamado de trovão, e que era também o deus do vento, da chuva e até das tempestades. É certo que seus pais haviam sido mortos pelas tropas do ilustre Naamã. Tudo assim, dramático, injusto e doloroso. Porém, é necessário refletir nas atitudes dessa menina frente aos acontecimentos que se seguem.
Era uma criança hebréia, provavelmente uma adolescente para os dias atuais. Era hebréia, e certamente fora ensinada que a mão de Deus estava sobre sua vida, como havia sido com José no Egito, com o Rei Davi, com Rute num país estranho e tantos outros. Esse é o primeiro confronto com a situação adversa dela. A segunda, foi que estava comprometida com um Deus de misericórdia, em contraste com a solidão, a raiva e a depressão que se esperava dela. A menina tinha uma relação fundamentada na misericórdia, coisa da intimidade, e isso construía a paz em sua alma. Por isso não se deixou amargar pelo ódio, não foi lesionada pelo ressentimento e nem adormeceu pela depressão. Foi isso que a fez ver duas coisas que só os limpos de coração podem enxergar: ela viu no líder do exército inimigo uma carne apodrecida pela lepra e uma alma perdida no meio dos deuses, dos ventos, das chuvas e das tempestades. Foi aí que ela falou da sua terra, do seu Deus e do seu profeta...
Essa é a segunda pessoa dessa trilogia, uma menina sem nome, que, pelo fato de não se deixar envenenar pela vingança, pelo ressentimento e por não dormir seus olhos na depressão, viu sua fala mover um general, dois reis e um profeta, a ponto de quase provocar um incidente internacional... Isso, porém, ocasionou um dos maiores episódios de cura e libertação da história bíblica.
Assim, sem nome, mas que acreditou numa coisa simples: Deus estava com ela, como foi com José no Egito, sua relação com Deus descansava na misericórdia, isso a livrou das fobias de sua alma e lançou sua história nos livros dos reis para as gerações vindouras. O que ela deixou? A capacidade de ser livre quando tinha tudo para ser triste, vingativa e depressiva.

Paz e a gente se encontra pelos anônimos enviados por Deus...
Eliel Eugênio de Morais
Pastor

SOBRE UMA DE TRÊS PESSOAS


A Primeira Pessoa


O profeta Eliseu, o primeiro personagem de uma trilogia do segundo Livro dos Reis no Velho testamento. Seu nome significa “Deus é salvação” e seu trabalho aparece como aquele que aproximou homens e mulheres de Deus através da demonstração carinhosa do amor e da graça de yawé, o seu Deus. O maior desafio deste profeta foi servir a Deus e aos homens dentro da tênue linha da “severidade e da bondade” de Deus, basta ver seus encontros com a viúva de Sarepta, os filhos dos profetas entre outros.
Os estudiosos dizem que ele foi o maior realizador de milagres no VT, ficando atrás apenas de Moisés. Foi discípulo de Elias e se tornou maior que seu mentor. Porém, é no episodio com o chefe militar da Síria, Naamã, que Eliseu protagoniza um dos mais belos acontecimentos de cura de toda a história antiga. Mais do que contar o ocorrido, essa crônica visa levar o leitor a andar pelas mesmas linhas de caráter do procedimento do profeta. É esse o propósito. Pensemos então o seguinte:
A cura ocorreu de forma tão íntima que o general sírio, o doente curado, voltou e ofereceu presentes generosos ao profeta. Eliseu os recusa, mesmo sendo isso um costume de muitos de seus contemporâneos. Porém, um dos seus discípulos sai em procura do general e racionaliza sua cobiça, visto que lhe pareceu lícito obter vantagens pessoais na ministração do sagrado. Fez isso, ganhou presentes e, leproso, desapareceu da história. E o presente texto racionaliza também: não possuímos habilidades semelhantes às do discípulo do profeta? Refiro-me às coisas do engano e da trapaça, como se o sagrado e o humano fossem coisas a negociar. É por isso que necessitamos da teologia de Eliseu, aquela que nos faz perguntas complexas. Não é essa a proposta do evangelho? Não é ele uma palavra interrogativa dos nossos dias e das nossas almas?
Eliseu teve a ímpar capacidade de “desertar” as pessoas para a responsabilidade e a integridade. Digo eu: que ministério complexo, doloroso e prazeroso! O profeta não sucumbiu ante o brilho e o prestigio de seu ilustre visitante e, por isso mesmo, o serviu com as duas melhores e mais nobres dádivas: a cura da lepra, que é coisa terrena, mas que escraviza o sonho; e a cura da alma, que é coisa para a eternidade e que, por irônico que pareça, o forte general não via. E, no fim de tudo, o principal legado de Eliseu foi sua fidelidade no exercício do dom que recebeu.

Paz e a gente se fala pelas curas provida por Deus...

Eliel Eugênio de Morais
Pastor

segunda-feira, 14 de junho de 2010

O inverno está chegando

Que seja bem vindo o tempo paradoxal do ipê, figura do ser humano e das surpresas que a beleza nos reserva!

sexta-feira, 11 de junho de 2010

DEVOLUÇÃO DE UM TEMPO


O outono está indo embora. Suas tardes morosas de sol pálido estão dando lugar ao friozinho despretensioso das noites de inverno. É que as paineiras já exalam seu encanto de cores rosa e as flores roxas se multiplicam pelo campo. Sinal de que o inverno está chegando.
Parece que poucos dias se passaram desde que escrevi sobre o começo da primavera, é que o inverno morria e eu queria que ele ficasse um pouco mais, pois havia sido frio para ser longo, seco para ter alguma dor... Mas foi florido para ser amado, e belo para ser breve. Agora ele volta, é a devolução das floradas que somente acontecem no tempo dele, dias de noites com multidões de estrelas, com alguma paixão para fazer sangrar, um ipê roxo para falar de fugacidade, uma palavra para adorar...
Aí talvez esteja sua maior figura. Tenho o pensamento voltado para um texto do Velho testamento que translitera a idéia da devolução: “Quando o Senhor restaurou a nossa sorte, ficamos com quem sonha”. Nossa alma é assim. A restauração diz que já houve algo salutar antes e que por algum motivo se deteriorou. A volta do inverno expõe isso diante de nossos olhos. Penso nas coisas que mais amo, como por exemplo, a sangria do ipê roxo ou amarelo, a exuberância da paineira cor das rosas ou a simples florada da mangueira, isso são coisas devolvidas, vagarosamente, depois das torrenciais chuvas de verão. Figura de outras coisas, eu bem sei. Sei também que o outono é um aviso de que a mudança já começou. Porém, existe um alerta em meio a tudo isso: a brevidade, marca incontestável do ser humano. O inverno, que tanto quero, será breve. As demais estações seguirão seu curso.
Por aí reside a insondável sabedoria do Eterno. É um tempo de devoluções. Deus nos chama às coisas leves da alma e, se o inverno tem a florada como algo suave e feliz, o que será que é necessário à alma? O texto é breve, então fico numa só palavra: adoração! Então, a coisa leve do ser humano é render-se diante do que não terá fim, é beijar e comer a essência daquele que nos faz andar do vazio para a plenitude, é deixar-nos levar cativos por aquele que venceu nossas feiúras mais íntimas. Então, uma alma devolvida é aquela que achou a adoração por tudo o que Deus é e por tudo o que ela mesma não tem, é o que viu e sabe que falta a si mesma. Isso, por fim, é paz.
Fim de tudo. O outono agoniza, o inverno está às portas, o tempo que mais quero está sendo devolvido. Sei de sua fugacidade, porém amo sua eternidade. Mais que isso, compreendo sua parábola. O inverno é um convite às coisas plenas, não pelo frio que tem, mas pelas flores que ressuscita. E a alma? O que são suas coisas leves e aquelas que não são temporais? Talvez estejam escondidas naquilo que já foi salutar um dia e que hoje corre e espera pela palavra infinita do Velho Testamento: “Quando o Senhor restaurou”... Como foi com a paineira desfolhada por todo o outono e, agora, mostra a exuberância de uma florada cor das rosas.


Paz e a gente se fala pelos tempos devolvidos por Deus...

Eliel Eugênio de Morais
Pastor
Colorado do Oeste, 11 de junho de 2010.