segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Sobre Pedaços e Metades

Lucas, em seu evangelho, apresenta-nos uma seqüência de três parábolas, todas se referindo à moral e à consciência. Nas três, o texto pressupõe a idéia de que alguém está se perdendo e que alguém está procurando. É a generosa teologia da graça, aquela que se esclarece no amor e no imerecimento.
Há dois tipos de pessoas que se aproximam para ouvir: publicanos e pecadores, que são os tipos mais execráveis de gente, incluindo aí, explicitamente, as prostitutas. Esses são os que chegam para escutar. E por que o fazem? Porque são escórias da religião e nada possuem que os possa transportar a um nível de merecimento. São execráveis e nada merecem. Há, porém, outro grupo de ouvintes: Os fariseus e os escribas. Esses são os religiosos corretos, o legalista e o teólogo. São esses que criticam a Jesus por gastar seu tempo com os imerecidos e aprofundam seus ciúmes e despeitos referindo-se à intimidade com que Cristo os trata, pois que os recebe e come com eles. Esses fariseus e escribas, justamente por suas posturas, representam a religiosidade desprovida de paixão e intimidade, voltada somente para si e seus próprios interesses.
A trilogia de Jesus neste capítulo é formidável. A primeira parábola apresenta a figura da ovelha. É que uma, no meio de cem, se perde. Que alívio, um por cento de mim tem a tendência de ir para o deserto, dar a cara aos espinhos, ficar à mercê do lobo. Depois vem a história da dracma... E é uma que se perde em dez. É um pouco mais complexo. Significa que um pedaço maior de mim é assim, com essa vocação para a escuridão e os cantos escondidos da casa. Por fim, a história dos dois filhos. Que tragédia, que cruel, que esperança!... Agora é metade de mim que se ilude com a terra longínqua e com a vida dissoluta. E tudo começa e se repete. Sou a ovelha que vai para o deserto, sou o pedaço maior que, como a dracma, ama a treva e o sumiço. Por isso, surpreendo-me como a outra metade, essa que deseja ir, tomar os bens que recebeu do pai e desperdiçá-los dissolutamente – A mais vil compreensão de liberdade. Por isso, serei faminto e miserável, buscando socorro na terra distante. E o que tem lá? O que se pode achar longe da casa do pai? Para a miséria, um trabalho com porcos e, para a fome, comida de porcos...
Assim termina a trilogia, surpreendente figura de mim. Deus me avista de longe, mas o sentimento que o move é íntimo. Aí está o exuberante conceito da graça: o filho que volta é tratado como não merecia. A questão sempre será assim, pessoal e íntima, a palavra de Deus é sempre na vertical. Então considero uma última coisa, surpreendente e dolorosa. Sou também a metade que ficou, na figura do filho que fez tudo certo, mas que como o fariseu e o escriba, não amou o pai e nem sofreu com a partida do irmão, não se alegrou com o regresso do perdido, mas se deixou consumir pelo ciúme e egoísmo, como a prostituta que faz tudo certo, porém é desprovida do amor. Surpreendo-me às vezes como esses escribas e fariseus, embustido em outra aparência.
E se assim é, suplico para ser a dracma que se perdeu, a ovelha só e ferida, o filho visto de longe, mas chamado na intimidade... Só assim, a porta da moral e da consciência, misericórdia, estará sempre aberta.

Paz para você e a gente se fala pelas parábolas da vida!...

Eliel Eugênio de Morais
Pastor

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