sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

SOBRE PRESENÇA E TROCAS




Fique vivo
Há tempos ouvi uma palavra sobre troca. Ela me encantou, porém não me assustou. Achei que ninguém faria aquilo. Os anos passaram e aquela palavra se tornou, além de encantadora, assustadora. Naqueles dias ela propunha uma pergunta: o que daremos em troca do tempo de tocar, andar despretensiosamente com quem se ama? O que dar em troca de beijos e abraços? Isso foi numa palestra para educadores. A fala foi concluída com aquela velha frase: “formar uma geração que saiba ter opiniões e não apenas apertar botões”. Essa palestra pressupunha uma coisa inegável do ser humano: sua complexidade de idéias e sentimentos.
Pois eu estava vendo Televisão e entrou na tela um comercial da Vivo (fique vivo). Foi quando a ideologia daquela antiga palestra renasceu. Uma criança pergunta ao pai se é verdade que ele vai embora. Sim, é uma verdade cruel. Porém, ela não precisa se preocupar, ele tem um aparelho. Ah, esse aparelho irá substituir a presença dele! E cita os momentos: na alegria de uma aula de balé, no prazer de um sorvete, na solidão da noite quando o medo assalta a alma da menina... O pai não estará lá, mas tem o aparelho da vivo. E ele liga...
Penso duas coisas. Uma é elementar e a outra é reflexiva. A elementar irá perguntar: não existe ninguém de sensibilidade nessa empresa para perceber a sordidez da ideologia deste comercial? A reflexiva irá lançar mão de uma leitura mais acurada. Vamos dar a mão à palmatória. Não estamos fazendo a mesma coisa com outros nomes? Filhos, maridos, Deus? O que estamos substituindo e com o que? Não será este comercial apenas uma versão celularizada dos nossos valores? É que temos o dom de olhar as pessoas como se fossem aparelhos e não seres com idéias e sentimentos. Ah, e quanto ao comercial? Pois bem, ele tem uma coisa de valor: o momento. É o momento da alegria na dança do balé, o momento prazeroso do sorvete despretensioso e o momento da solidão e medo da noite... Em todos eles a menina está só, substituída a presença por um aparelho. O que daremos em troca da presença nesses momentos? Não se engane, maridos, esposas, filhos e pais, são daquelas coisas que não se resolvem apertando botões. Até porque nunca vi um celular respirar, ter calor para acalentar, aconselhar... Nenhum dói quando erra ou vibra quando acerta. Não existe um corpo sequer que, na dor ou no prazer, se contente com a fria presença de um aparelho, seja ele qual for.
Fique vivo – Não morra na ideologia do comercial. Termino voltando à idéia da antiga palavra. Deus é assim. Pessoas são assim. Quão parco mundo, desprovido de alegria, de dor e amor, é que nos faz pensar que aparelhos e coisas podem substituir beijos e abraços. Só falta criar um que nos ligue diretamente ao céu, para suprir nossa famélica vida de Deus.

Então, a gente se fala pelos discernimentos que nossa alma procura!

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