sábado, 11 de julho de 2009

CHEIRO E COR

Palavras são armadilhas. Cores são armadilhas. Hoje, escrevendo esta crônica, vejo o inverno dominar Rondônia. Escrevo para ter clareza, para ver se, no meio das palavras, encontro uma que responda o que foi que tive com Deus, o que houve entre mim e o Espírito Santo e com os outros dons que tanto amei. Essas armadilhas são fascinantes, gritantes, dilatadoras, por isso, belas. Abro esta crônica, que deve ser breve, para dizer um pouco mais dessa maturação. A armadilha conduz à clareza porque investiga a alma. Então este texto é mesmo pelo Espírito Santo. Neste instante em que a chuva parece distante e eu paro para pensar, é que as cores e as palavras tomam forma e posso ver a arapuca delas.
Deus ama as coisas humanas. Isso já ficou dito. Posso ver essas coisas dançando em mim como a moça do brinco de pérola (um filme memorável), e entendi-as de forma concreta num longínquo fim de tarde do mês de agosto. Uma parábola nasceu de um fato irrelevante, e eu pude, enfim, interpretar essa procura de Deus, como ainda não tinha percebido. Foi assim:
Eu viajara ao Tocantins num programa de família. Era fim de tarde, ar agreste pela seca e pela fumaça das queimadas de agosto. Eu andava no morrer desse dia, ia pelas ruas da cidade pequena. Então senti um cheiro precioso, um perfume que não conhecia e que enchia a rua. Andei procurando sua fonte. As pessoas que passavam ou que estavam à porta de suas casas, pareciam indiferentes ou não percebiam a riqueza daquele aroma. Então, numa rua estreita e vazia, achei sua nascente. Uma árvore de médio porte, em frente ao quintal de uma casa pequena, sem muros. A árvore estava coberta com flores brancas de onde fluía o desconhecido e precioso perfume. Cheiro e cor no agreste do cerrado. Parei debaixo dela, ferido por tamanho encanto e por tão singular dádiva. Tristeza e alegria numa rua insignificante de uma cidade insignificante. Chamei a dona da casa, quis saber o nome daquela árvore. Ela riu, espantada com meu encanto. Não sabia o nome, não gostava da árvore, era-lhe dificultoso varrer o tapete branco que se formava todos os dias. Espantado fiquei eu. Procurei por outras pessoas na rua. Ninguém soube o nome. Era uma árvore inútil porque não produzia frutos comestíveis.
Saí de lá ferido e, ainda mais, marcado. Mas era um segredo. Uma beleza tão magnífica de odor e cor, incógnita, sem nome naquela rua agreste, possivelmente, exposta ao rancor de uma vassoura. Esse fato, tão inconseqüente, ficou para mim como uma parábola da vida e da paixão de Deus. Bem assim Ele é, até mesmo incógnito para muitos, mas sua palavra foi dada para espargir cor e cheiro ao mundo. Quem viu? Quem a conheceu? Isso são coisas próprias das armadilhas. Só quem nelas caiu pode dizer de sua dor e de seu amor. Deus, a grande maturação da minha lealdade e da nuança do meu amor, teve, naquela árvore e naquele cheiro, a parábola que pude apreender dele.

Colorado do Oeste, 28 de Julho de 2009.

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