sábado, 11 de julho de 2009

EM DEFESA DO AMOR

Não há nada que se possa dizer em sua defesa. Ele é pleno. E tudo o que é pleno, dispensa qualquer apologia. Porém, nenhuma palavra tem sido tão desqualificada como o amor, até mesmo por aqueles que se dizem amantes.
É que o amor vive e se realiza em coisas abstratas, dessas que caminham pela sabedoria ou por outras qualidades internas. Desconhecer essas estradas e essas qualidades é como navegar por um rio seco e não se dar conta disso. O tema é imensurável e o texto é pequeno, por isso abre-se aqui apenas algumas dessas estradas, um flerte com o desenho da alma de alguns amantes.
Quem ama é devedor. O apaixonado reconhecerá a dádiva do sentir e se verá um devedor da emoção, do desejo, do infinito privilégio de se achar submisso ao corpo e ao sonho da outra pessoa. Será devedor por ter em quem lançar suas fantasias, sua necessidade de toque e de proteção. Pablo Neruda disse que era devedor de sua amada por todos os lugares onde os relâmpagos errantes se esconderam. O amante sabe-se devedor porque sempre tem para onde e para quem regressar, seja das distâncias, das fadigas do dia ou do desejo famélico de amar.
O amante é também um suplicante. Toda ordem ou queixa subestima o amor e furta sua mais incrível habilidade: liberdade! Por isso o amor é uma súplica. Sabe-se desprovido do cheiro, do que mais quer. É essa qualidade que fará da pessoa que ama um desmascarador de si mesmo, pois verá que de todas as coisas necessárias para a vida, a alma se alimenta, paradoxalmente, do que parece menos necessário. Afinal quem poderia imaginar que coisas como o toque, palavras, flores e beijos são mais valiosos que todas as coisas necessárias? É aí que o suplicante vê a diferença entre amor e contratos, beijos e compromissos. Ele suplica porque é pobre e a plenitude do ser humano se alimenta dessa pobreza.
Uma coisa só a mais. Quem ama assim é, por fim, caçador. Procura os elementos mais despercebidos da alma e do corpo do outro. E, por ironia ou por dádiva, acredite, aí está a maior liberdade da alma humana. Quão enganado está aquele que ama com a doença do ciúme ou com o germe da desconfiança. O amante é caçador das nascentes do amor, é capaz de reter uma imagem, beber um som, achar significados num cheiro. Por isso, por ser devedor e suplicante, não reterá a nascente, não armará uma gaiola para prender a pessoa amada ou os sentimentos e sonhos dela. Deixará a nascente fluir e, justamente por ser livre para fluir, poderá nascer todos os dias. A liberdade é o fim da caça. Assim, e somente assim, se pode amar uma pessoa por toda a vida.
O amor não precisa mesmo de defensores, até porque o texto é mesmo breve. É melhor então dizer que o amor necessita é somente de um pouco mais de devedores, de suplicantes e caçadores. Talvez assim se ache muito mais homens e mulheres um pouco mais plenos e um pouco menos desiludidos, que saiam dos rios barrentos e descubram a correnteza imperfeita, porém repleta de beleza e significados do amor.


Colorado do Oeste, 26 de novembro de 2008.

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