sábado, 11 de julho de 2009

SOBRE CEGUEIRA E CORES

Há algum tempo vi um filme que mais me pareceu um ritual de sensibilidade, cor e beleza: “A moça do brinco de pérolas”. O filme mostra uma história contada através das cores. Um tempo distante, uma história ida, um pensamento que volta.
Há menos dias eu estava num lugar público, em um banheiro publico. No fundo, um rapaz, pouco mais que um adolescente, sentado, de cara para a parede, imerso numa solidão profunda, embriagado numa qualidade de dor que só pude saber depois de ouvi-lo. É que ele era jovem, um tempo imenso pela frente, mas perdia na mesma velocidade dos dias que iam, a capacidade de ver as cores. Sofria de uma doença incurável que o levaria a uma cegueira inevitável. Assim, cada dia uma cor a menos, cada semana a frase de um livro que se ia, a cada mês, uma página inteira...
Hoje o sol rompeu na manhã de Rondônia, a luz passa pelas folhas das árvores, intensos e diferentes tons de verde e flores de variadas cores, múltiplos azuis no céu, nuvens brancas, varridas, levadas de um azul ao outro. E eu me ponho a pensar na complexidade da beleza posta diante dos nossos olhos. Tem gente que enxerga e não vê, tem gente que não pode mais ver e chora a ausência disso. As coisas da alma e as coisas do céu são assim também.
Penso em homem na beira de uma estrada próxima de Jerusalém. Um homem cego e pedinte. Precisava de cores e suplicou por elas. Jesus lhe perguntou: “O que você quer que eu faça”? A resposta foi: “Que eu veja”! Nossa alma é como esse homem. É insegura na treva, fica na beira do caminho gritando por luz, ou, vira adolescente outra vez e senta-se de frente para a parede e se põe a contar e chorar as cores que não tem mais, aquelas coisas inefáveis que se perdem um dia depois do outro.
E a vida com Deus é tão bela, tão intensa e luminosa como a manhã que acordou Rondônia hoje. Essa vida não é um tempo nublado, trancafiada em templos, ritos ou dogmas. É sim, plena de cores, de ventos e matizes sem fim. A palavra que bem a define é “liberdade”. Porém, e quando a gente mesmo é o cego da beira do caminho? E quando nos surpreendemos de cara para o muro, sem cor e sem brisa? Então, esse é o tempo de colorir. Qualquer coisa, venha para a beira da estrada, saia da treva. Jesus é luz, mas é também cor. Aliás, deveríamos fazer mais aquarelas do que templos.


Colorado do Oeste, 23 de Abril de 2009.

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