sábado, 11 de julho de 2009

A TEOLOGIA DO IPÊ COR DAS ROSAS


Não sei se é direito pedir um tempo de mais suavidade aos filhos de Deus, àqueles que labutam em algum terreno adverso. Não sei se isso é sábio ou até se está em desacordo com a teologia dos mártires. Não sei se posso pedir que o sofrimento seja banido, que a intolerância, seja qual face tiver, seja soprada para o infinito dos sete mares. A teologia dos mártires tem a clareza da porta estreita, nunca se fantasiou com um cristianismo de rosas, mas sempre soube do preço do discipulado e sempre deu as caras à intolerância e ao senso comum, rotulado, dos valores convencionados.
Eu soube que, nessa semana, cristãos foram mortos na índia, centenas deles, por muçulmanos radicais. Soube também que em Moçambique ocorreu a mesma coisa e que na fronteira tríplice entre Brasil, Colômbia e Peru, a igreja tem sofrido ameaças dos traficantes porque ela está “roubando” sua mais preciosa mão de obra: adolescentes e pré-adolescentes que procuram a igreja para escapar do crime e freqüentam os cursos alternativos que ela oferece. Isso é só uma mínima mostra do que tem acontecido aqui e no mundo. Eu queria pedir um tempo de paz a esses trabalhadores do reino de Deus, suplicar que seu labor fosse mais suave. Quis fazer uma apologia à teologia do descanso... Mas, eles sabem, sempre souberam do preço de trilhar pela porta estreita.
Porém, ontem vi um ipê rosa num quintal abandonado de uma velha construção. Uma beleza primeva, quase agressiva, de uma suavidade tal que parecia um convite à teologia das coisas plenas da alma. E eu sabia que em algum lugar ermo de Moçambique existia alguma família partida, algum pai sepultado, alguma filha sozinha... Esse foi o preço da intolerância. Sei também que lá na fronteira com a Colômbia, o crack tem sido confundido com estrelas num campo onde se fuma nas caladas da noite, e têm adolescentes morrendo, escravos de si, de pais distantes, também chafurdados na escuridão, capturados por falsas estrelas. No meio disso, numa construção abandonada, bem perto de mim, encontro a exuberância do convite à plenitude nos cachos rosados do ipê.
Não sei se isso é direito, mas queria que esse ipê brotasse na terra dos intolerantes indianos, que suas flores se espalhassem no chão destroçado pela guerra de Moçambique, que comovesse e acordasse ao belo os adolescentes das pequenas cidades que ainda confundem droga com estrelas. Ponho-me a pensar e a sentir uma teologia constrangedora: como pode em meio a tanta dor existir tamanha beleza? É por essa beleza que escrevo e que suplico, na esperança final de que pelo menos na alma dos que labutam, antes que o inverno chegue de verdade, quando menos esperarem, ao dobrarem uma esquina, surpreendam-se com a exuberância do ipê cor das rosas. E saibam, não estão sós. Alguém vê, alguém ama, alguém suplica pelas coisas plenas da vida.

Paz e a gente se fala pelos ipês de qualquer esquina...


Colorado do Oeste, 16 de Junho de 2009

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